quinta-feira, 19 de março de 2009

A gente os dois dávamos cabo disto...


Somos unha com carne ou não somos.

 Trata-me por padrinho ainda estou para saber porquê: razões que só ele entende. Esteve preso uma porção de anos, catorze, quinze, traficava pó, metia pó, continua a traficar pó e a meter pó, na semana passada procurou na meia esquerda (na meia direita trazia dinheiro escondido, uma porção de notas) tirou da canela um par de saquitos

 - São para você, padrinho, e lá fiquei com a coca na palma enquanto ele me dava um beijo

 - Somos unha com carne ou não somos?

 na esperança que eu corresse para casa a enfiar o presente pelo nariz acima. Afaina-se para uns rapazes russos, de vez em quando pede dinheiro às pessoas com uma navalha persuasiva, cheia de argumentos: parece que a navalha torna as pessoas generosas, sensíveis às razões do meu afilhado. Na mão e no braço tatuagens da cadeia que exibe no orgulho com que se mostram carimbos de países exóticos no passaporte: Vale de Judeus, Pinheiro da Cruz, outras estâncias balneares, sítios de férias de luxo para ricos. Um amigo comum, estabelecido no bairro, aconselha-me - Não se ponha a pau, não a agitar o dedo avisador e não me ponho a pau. A pau porquê? O mais que ele faria era apontar-me as razões ao umbigo quando a branquinha lhe subisse à ideia. Garante, de lado

 - Você escreve livros e demora-se a olhar-me, pesando o facto. Em certa medida somos iguais

 - Também já apareci no jornal

e nunca vi bochechas tão côncavas ao chupar o cigarro: o fumo deve chegar-lhe à alma e enovoa-la inteira. Contam-se-lhe os ossos de magro que está, faltam dentes. Interesso-me

- Mastigas com quê?

e encolhe os ombros, desiludido com a estupidez da pergunta: há-de existir um molar em qualquer parte, nem que seja no esófago, a roer ainda. Que me lembre nunca dei por ele a comer, dou por ele, aqui e ali, a trabalhar cálices de bagaço com sete ou oito cotovelos no balcão, pobre tarântula tão mal vestida, à beira de ser encontrada num jardinzeco qualquer, de agulha no braço, ou a bater, na vazante, contra a muralha do Tejo: já traz a morte na cara, e a boca desmobilada aparenta-se a uma concertina de pregas tortas. Mês sim mês não desaparece, acaba por voltar a puxar-me a manga

- Precisa de alguma coisa minha, padrinho? espiando em volta, com medo. Não me conta onde dorme

- Por aí, não me explica onde esteve

- Lá está você,  transformou os três pontos tatuados de uma das prisões numa estrela de David

- Há muito chibo nestas bandas, designa-me sujeitos que o perseguem em esplanadas onde não vejo ninguém, cola-se-me à orelha, confidencial

- Ando a faltar aos russos e contrai-se de medo:

- Tem por aí meio euro que me empreste, dado que um golinho de bagaço engorda a coragem e traz boas intenções consigo:

- Um dia destes trato-me -projectos de vida

- Internadinho para uma cura à maneira

certezas que o alcool ajuda - Até sou capaz de me casar, palavra com a voz a pedir colo, seguro de caber no meu

- Somos unha com carne ou não somos?

 e não lhe poiso a palma no ombro para impedir que chore. Se calhar engano-me e está sequinho por dentro. Não, não está sequinho por dentro

- Eh pá consigo fico esquisito, padrinho e um grão de ternura, intacto nele, a tremer, a arredondar-se, a transformar-se em lágrima que a manga limpa o que a mão não acaba de limpar

- Tenho uma filha - Uma filha sabia?

puxo de mim - Onde está ela? e a resposta furiosa

- Lá está você a empurrar-me

- Lá está você, carago a detestar-me. Julgo que a faquinha vai vir e não vem, vem um murmúrio

- Padrinho

            a convicção - A gente os dois dávamos cabo disto num gesto panorâmico a abarcar o mundo

- A gente os dois chegávamos e ele, todo côncavo, a chupar o cigarrinho, a chupar. Segue rua abaixo a caminho de uma nova desdita, num passo vagaroso, oblíquo, enredando-se na trela do basset de uma senhora de idade

- Porra de cão e a senhora, de saco de compras, apavorada. Salva-se da trela, continua, vira uma esquina, perco-o. Se o chamasse ajudava? Se concordasse

- A gente os dois dávamos cabo disto

 melhorava? É a lágrima que a manga limpa que me inquieta. Também tenho uma ou duas, escondidas. Só que tão no fundo de mim que não consigo limpá-las. Não faz mal: ninguém dá por isso. E se dessem por isso não davam: de pequeninas que são confundem-se com a pele. Tens razão: unha com carne, afilhado, tens razão, a gente os dois dávamos cabo disto. Algum de vocês tem por aí meio euro que me empreste para enganar a coragem?


de António Lobo Antunes, na revista Visão

 

segunda-feira, 16 de março de 2009

seré chuva será gente... gente não é certaMENTE

         
poema da 'MENTE'
  
 Há um primeiro-ministro que mente,
 Mente de corpo e alma, completa/mente.
 E mente de maneira tão pungente
 Que a gente acha que ele, mente  sincera/mente,
 Mas que mente, sobretudo, impune/mente...
 Indecente/mente.
 E mente tão nacional/mente,
 Que acha que mentindo história afora,
 Nos vai enganar eterna/mente.

Sócrates efectiva/mente

domingo, 15 de março de 2009

a NOVA PESTE de GonçaloM.Tavares

«Declare o estado de peste. Encerre a cidade»
Albert Camus

Tudo começou por uma noite amorosa. Uma mulher conheceu um homem e nessa noite homem e mulher dormiram juntos.
Os dois falaram como dois seres humanos falam entre si. Ela relatou com entusiasmo o que fazia num laboratório científico, ele, por seu turno, contou que estava desempregado. Os dois sorriram e ela lembrou que o mundo , em princípio, não terminava na segunda feira. Havia mais mundo e mais tempo. As coisas mudariam disse ela.
E mudaram de facto. Na manhã seguinte, quando ela regressou ao seu local de trabalho, tinha uma carta na secretária do seu laboratório: estava despedida.
Foi então essa mulher que, digamos assim, mesmo sem disso ter consciencia, começou com a nova peste. Contou a uma das suas amigas: dormira com um desempregado e na manhã seguinte fora despedida.
Dois ou três casos semelhantes em diferentes pontos do país foram suficientes. Em pouco tempo espalhou-se uma crença firme: quem dormisse com um desempregado corria o risco de perder o emprego. Não havia uma explicação lógica para isto, mas o certo é que se começou a recear os parceiros sexuais desempregados tal como antes se receava os parceiros sexuais com doenças venéreas.
ntes de qualquer relação sexual tornou-se habitual a pergunta: tens emprego? Muitas pessoas passaram mesmo a exigir um comprovativo do pagamento do ultimo mês, passado pela entidade patronal. Algumas pessoas, habituadas a relações ocasionais, passaram a trazer na carteira esse documento.
A verdade é que o número de desempregados não parava de aumentar e dado o potencial daquela notícia o alarmismo foi crescendo...........

quarta-feira, 4 de março de 2009

ontem, 3 de Março de 2009

um amigo meu recebeu uma notícia, que tinha um novo combate pela frente,
este a travar com um monstro de enorme envergadura, notícia essa que para a qual não estaria (penso) neste momento preparado para a receber...,
mas,
mais uma vez saltou para o ringue e disposto a dar tudo por tudo lá voltou a ouvir aquele som inconfundível do "SEGUNDOS FORA 1º ASSALTO" !
força nisso CAMARADA

domingo, 1 de março de 2009

actividade sexual....

A apresentadora de um programa feminino das manhãs da televião, pergunta à D. Irene, uma jovem senhora:
- A senhora pode contar aos nossos telespectadores quais são as actividades de uma típica dona de casa deste bairro?
- Ah, sim...
De manhã, levo os meninos ao colégio. Depois, na volta do colégio, tenho três horas de actividades sexuais...
Então, o meu marido e filhos chegam para o almoço, almoçam; ele volta para o trabalho e as crianças vão fazer os deveres....
Aí, tenho mais algumas horas de actividades sexuais até à noite, quando jantamos e vamos todos para a cama!

- Desculpe, mas a senhora pode explicar-nos em que consistem essas actividades sexuais?

- Ah, lógico, explico sim!

Actividades sexuais é fazer tudo o que é fodido: varrer, lavar o chão, lavar a roupa, arear as panelas, lavar e tratar do cão, arrumar, costurar, passar as roupas, limpar o pó, lavar os vidros....

Essential Guide To Safe Well Water Maintenance

If your home relies on well water, ensuring its safety and quality is your direct responsibility. Contaminated well water can harbor harmful...